Proposta 2: Tipografia

16 04 2010

A segunda proposta consiste em criar uma composição tipográfica, em formato A4, relacionada com três dos heterónimos de Fernando Pessoa: Ricardo Reis, Alberto Caeiro e Álvaro de Campos. Todas as composições partiram de um verso de cada um dos heterónimos pessonianos. Aqui fica o resultado final da proposta, assim como as memórias descritivas.

Composição Ricardo Reis

«Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim – à beira-rio,

Pagã triste e com flores no regaço.»

Nesta composição, inspirada pelos versos de Ricardo Reis, o mais clássico dos heterónimos de Pessoa, optamos pela simplicidade e sobriedade e pela orientação horizontal da folha.

Escolhemos uma figura clássica para dar forma à composição, Vénus, a deusa romana da beleza e do amor. Para criarmos o retrato desta Vénus, que simboliza a pagã de quem Reis fala, escolhemos a famosa pintura de Botticelli. Decidimos colocar os versos de Ricardo Reis (acima citados) nas madeixas de cabelo ao vento de Vénus, numa fonte serifada (bastante clássica) a negro. O texto obrigatório foi colocado de forma a perfilar o rosto de Vénus, num tom mais claro, para que o destaque fosse para os versos.

Composição Alberto Caeiro

«Tristes das almas humanas, que põem tudo em ordem,

Que traçam linhas de coisa a coisa,

Que põem letreiros com nomes nas árvores absolutamente reais,

E desenham paralelos de latitude e longitude

Sobre a própria terra inocente e mais verde e florida do que isso!»

Na composição tipográfica sobre Alberto Caeiro, orientamos a folha A4 na horizontal. Do lado esquerdo, sobre o texto base semi transparente, colocamos uma mão, a mão de Caeiro, como símbolo das sensações. Colocamos a assinatura “Alberto Caeiro”, no polegar, num tom pastel, que representa a subtileza.

A partir da ponta do indicador, sai uma linha que cria um movimento circular, em espiral, e que representa o acto de vaguear por caminhos, tão típico deste heterónimo que, tal como o poeta Cesário Verde, deambula em busca das simples maravilhas do mundo.

Essa linha circular, constituída de letras, de versos, acaba por desenhar uma flor, também ela, símbolo daquilo que a Natureza pode oferecer.

Em suma esta composição, que prima pela simplicidade, representa os dois pontos essenciais da poesia de Caeiro: as sensações (representadas pela mão) e a Natureza (representada pela flor).


Composição Álvaro de Campos

«Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!

forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!»

Na composição de Álvaro de Campos, o futurista, começamos por desenhar com algumas letras e caracteres uma bomba, que simboliza a explosão de sensações, o barulho.

Para os versos, optamos por Arial Black, uma fonte de contornos simples, sem serifas, muito ao género das linhas rectas do modernismo. Escolhemos enquadrar os versos em duas partes, duas formas rectangulares, uma orientada verticalmente e a segunda orientada na horizontal. Dentro destes rectângulos de texto, “jogamos” com os tamanhos de letra, destacando algumas palavras como “Forte” ou “Fúria”. De destacar que a ordem dos versos não foi seguida propositadamente, invertendo um pouco a disposição dos mesmos no poema.

No canto superior direito, em grande destaque colocamos o rosnar das máquinas, a negro e numa fonte com serifa, na diagonal. O texto de suporte foi inserido na parte direita da composição, na vertical, funcionando como base para os outros elementos dispostos nessa zona da composição. Ao lado da segunda parte dos versos, foi colacado em grande e a vermelho, por cima do texto base, um ponto exclamativo, que simboliza a exclamação, o entusiasmo e a euforia de Álvaro de Campos. O vermelho foi a cor escolhida para este ponto de sinalização por estar relacionada com o estado de alerta, mas também para dar algum destaque à exclamação.

No canto inferior direito, foi colocado o nome do heterónimo, com a repetição da fonia r-r-r, numa forma circular a branco, por cima do texto escolhido. Nesta composição predominam o preto e o cinza por simbolizarem a indústria, as máquinas, ou seja, o movimento futurista.

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Com esta proposta, foi possível compreender as infinitas possibilidades criativas da letra, da palavra. A forma como se escreve pode ter tanto ou mais poder que o próprio significado das palavras. Está mais que comprovado que a tipografia constitui uma arte, a arte de brincar com as palavras, de as redesenhar.


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